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8 de junho de 2014

Assim não dá?

            Vamos continuar o assunto do post anterior. Esse vai dar bode, acreditem. Como vou falar de sexo quero deixar claro que usarei uma  terminologia provavelmente inadequada. Farei o melhor possível para manter um certo nível de adequação.

            O drama começa da seguinte forma: As pessoas namoram, transam, beijam, abraçam, brincam, fazem planos...até casarem. Continuam transando (menos) , abracando (menos) e brincando ( muito menos). Os filhos vem, a rotina dos afazeres vem, os problemas de orçamento vem (ou não), questões das famílias de ambos, divergências aqui e ali e tudo que o senso comum tem bem registrado sobre as questões de convívio. Fui rápido e eventualmente generalizador porque quero chegar logo ao ponto. E o ponto é: chega uma hora que as mulheres , prestem atenção que por enquanto estou falando das casadas e não todas, não querem mais transar. Não querem nunca mais? Obvio que não. Não querem quanto? Varia muito, mas em geral vão querendo cada vez menos. Não fiquem bravas pelo amor de Deus!!! Não estou acusando, não estou julgando e já discutirei as possíveis causas e as frequentes consequências. O fato é que ela vão parando de "dar".

            Muitos homens vão perdendo o interesse inicial, diria eu, todos. Há , no entanto uma diferença entre perder o interesse no homem e na mulher. O homem sem tanto interesse tem mais interesse do que a mulher sem tanto interesse. Volto a dizer que isso não serve para todos, mas insisto em dizer que estou examinando um aspecto da situação conjugal e para examina-lo preciso focar no ponto. Arrisco dizer, no entanto, que ele é muito , muito amplo e mantido abaixo de um pilha de tapetes maior do que a fabricação total de tapetes do Ira durante um ano.

           A mulher não quer mais dar....quase nunca, de vez em quando, sob esta ou aquela condição, se isso ou aquilo, antes disso e depois daquilo, ao invés disso e por causa daquilo que o marido disse, que aconteceu no emprego, TPM, VPM, GPS, URL, qualquer sigla vale.....e por ai a fora.

           Fase drama. Essa fase é dura, chata, trás estranhezas, silêncios constrangidos, magoas, brigas e muito lucro para os psis e misticos e toda minha turma podendo chegar ate ao velho e bom padre - coitado, já ta no celibato divino e tendo que ouvir os que estão celibato "voluntario" e mundano.

           E agora José? Bem e agora só tem três alternativas para o homem. A primeira é reclamar, falar , encher o saco da mulher e conquistar uma péssima fama de chato, carente...vai conseguir transar, mas a médio prazo vai se desmoralizando e perdendo a vez com a esposinha. Nessa fase há esperança de que alguma coisa mude. O nosso amante sofrido se corrige, para de ver TV, suspende o futebol, não reclama de nada, vai no Natal para onde ela quiser com que ela quiser. Resultado: uma transa porque lembrou a esposa. Resultados pífios, encarados como uma brutal derrota. A segunda é deixar vazar que tem alguma moca por ai querendo alguma coisa com ele, pode ser um torpedo meia sola de uma velha amiga do colégio, até um lembrete da secretaria que veio de uma maneira mais informal...hummm, bronca, desconfiança, paranóia...resultado quatro transas oferecidas com alguns privilégios já há muito esquecidos...se a ameaça some somem também as generosas ofertas. A paranóia é inimiga do celibato. Terceira alternativa. Essa talvez a mais velha de todas. O maridão começa a sair por ai, resigna-se com a letargia da casa e de nada se queixa, mas começa a ter grupos de vinho, discussões sobre tendencias no mundo da filosofia, arte, economia, ginastica, RPG, um longo tratamento no dentista das 19 as 21...este não se queixa de mais nada e não incomoda mais ninguém...talvez reste nele um sentimento de abandono que ele revida abandonando também.....Estão sentindo falta da hipótese de se separar? Não coloquei de proposito. Ainda não. Esse homem que acima descrevi não quer se separar, ele gosta da família e da esposa.

         Antes que as moças me matem preciso esclarecer que as mulheres se comportam assim sem nenhuma maldade, não são frigidas, deficientes, más, nem necessariamente não gostam do marido ou de si mesmas, elas não dão porque não precisam, nada mais. Já volto.


  1. O Nascimento de Vénus é uma pintura de Sandro Botticelli, encomendada por Lorenzo di Pierfrancesco de Médici para a Villa Medicea di Castello. A obra está exposta na Galleria degli Uffizi, em Florença, na Itália.




5 de junho de 2014

Traição , autoengano e alivio

O Senhor Deus disse à serpente: «Por teres feito isto, serás maldita entre todos os animais domésticos e entre os animais selvagens. Rastejarás sobre o teu ventre, alimentar-te-ás de terra todos os dias da tua vida». (Génesis 3, 14)

Desde a Antiguidade a serpente tem sido símbolo do mal, da traição e do diabo por ter induzido a Adão e Eva a comer do fruto proibido (fruto do conhecimento) no paraíso. 



Há um tema que muito me intriga há anos. Como médico muito pensei nele e como psicanalista ainda mais. Sou apresentado a ele diariamente e posso dizer que nada ou pouco sei ou entendo sobre a questão.

Eu comecei observando desde muito jovem que alguns homens tinham outras mulheres que não as suas esposas. Ouvia daqui e dali, na rua, em casa, mas sempre havia um mistério e um ar de tragédia, um segredo. Foi muito depois que ouvi que algumas mulheres “traiam” seus maridos. Essas, dessa época, eu conhecia pessoalmente porque eram mães de amiguinhos meus. Não sabia se era verdade e não sabia como era possível, afinal mãe não trai. Sobre os homens eu não achava boa noticia também, mas os conhecia menos, mas me decepcionavam também. Sabia que era proibido, errado, perigoso e que eu estava em contato com algo completamente não oficial. Era uma transgressão trair e outra ouvir e saber. Seriam atos que nasceram da lascívia, do desejo, da vingança, da tristeza, da sacanagem, da maldade? Sei lá, nunca soube a resposta para essas perguntas. Muito tempo se passou desta época, me formei em medicina e comecei meu estagio em psiquiatria, passei por vários hospitais públicos e privados, atendi em clinica psiquiátrica em consultório privado e fiz uma longa formação em psicanálise com o que basicamente trabalho nos dias de hoje.

Posso dizer que já ouvi muito sobre relações extraconjugais. São muitas maneiras e dinâmicas diferentes entre si mas que tem em comum um cônjuge julgar necessário ter relações (sexuais?) com outras pessoas. A amplitude dos fatores envolvidos tornaria impossível uma escrita breve como pretendo que essa seja. Por querer ser breve vou focar num fato que chama muito atenção.  Porque há tanta negação em torno disso? Porque as mulheres ficam nesses relacionamentos fazendo de conta que nada esta acontecendo? Os homens geralmente não ficam quando descobrem, mas muitos também ficam. Moralismo? Eu tentarei deixar aqui esse fator de lado porque apesar dele estar presente nas relações humanas o tempo todo porque o julgamento moral é profundamente empobrecedor e obscurecedor dos fatos. Confunde e simplifica demais.

Não foram poucas as vezes que ouvi a explicação que as mulheres que não trabalham não podem se separar. Nem sempre isso me caiu bem, mas de um tempo para cá passei a aceitar essa explicação e todas as outras. Não as tomo como necessárias verdades, mas como necessárias mentiras (não morais).

Recentemente a esposa do atual presidente francês François Hollande foi internada depois de saber pelos jornais que o marido tinha um caso com uma jovem atriz. Dizem que ela sabia do caso, mas que não queria que os outros (as) soubessem. Eu acredito. Um dos motivos que a mulher não larga o seu doce traidor é não perder tal propriedade (o pênis?) para outra mulher, afinal isso fica sentido como uma derrota. Compreensível, ainda que longe das exigências do que poderíamos considerar verdadeiro.  Afinal, como dizia Melanie Klein, fantasias são somente fantasias, mas seus resultados são reais.

Os anos de consultório e vida fora dele me mostram que a maneira como as pessoas elaboram suas insatisfações são variadas, mais ou menos adequadas a si mesmo e ao grupo e também variáveis nos seus níveis de consciência. Muita gente sequer percebe a sua insatisfação, percebem a demanda de prazer e isso é bem diferente e mais superficial.

Voltando a pergunta. Porque tantas mulheres ficam com seus “companheiros” infiéis  ou senão infiéis  ao menos maltratadores ou mentirosões?

Já soube de muitas amigas que perderam a amizade de suas amigas ao contar para elas sobre terem testemunhado o marido com outras. Mata-se o mensageiro da má noticia?


Eu insisto que só estou usando essa situação da mulher não por acha-la especialmente negadora, mas porque desde cedo foi como essa questão me chamou atenção. Homens e mulheres fora de situações de casamento, e namoro fazem a mesma coisa em suas vidas profissionais e sociais.
O artista catalão Josep Maria Subirachs As vezes quero pensar que a tal traição não existe, ou não existe com esse nome ou o sentido não seria esse. Essa "traição" faria parte de uma certa auto regulação de alguns relacionamentos e os ajuda a se manter. Sobre isso se dizia talvez ainda se diga que "as prostitutas mantem  os casamentos". Da onde sairia essa máxima senão dessa hipótese auto reguladora. 

Agora um segredo. Descobri que há um batalhão de mulheres que perdem o interesse no sexo e que isso acontece por centenas de razoes que vão desde o mais justo cansaço até o simples desinteresse que quando não criticado ou transformado em acusação ficaria como um simples, de fato, desinteresse. O problema é "faltou combinar com os russos". Esse desinteresse muitas vezes frustra o companheiro que ,se sentindo um mendigo de sexo se emburra, se infantiliza e piora muito para o casal a situação. Via de regra a mulher se ressente e o homem se magoa. Alguns desses homens se sentem autorizados a buscar alternativas. Estariam eles ao se cuidar dessa forma traindo, enganando a si ou mais alguém? Seriam estas as mulheres que "sabendo" disso sem saber "não" se incomodam? Eu não diria que sim porque muitas se incomodariam muito e diriam que o seu desinteresse não resulta de uma culpa só sua ou que o desinteresse mesmo sendo por auto-estima baixa em relação ao seu corpo ou alguma outra coisa só piora com essa acao do companheiro. Ficamos rapidamente sem saída como podem ver.

Interrompo por aqui para que possamos refletir um pouco. Ia esquecendo a parte do alivio. Seria um alivio se houvesse um pouco mais de esclarecimento sobre isso em pleno século XXI. Menos julgamentos, menos criticas, mais liberdade. Concordam?




11 de maio de 2014

Trecho do livro de Lionel Trilling Sincerity and Authenticity

"......A doutrina da impessoalidade do artista era lealmente
destacada pela crítica que cresceu com a clássica
literatura moderna. Nas suas relações com a personalidade a critica jogou um jogo elaborado, ambíguo e arbitrário.
Enquanto procura fazer-nos cada vez mais sensível às implicações da voz do poeta em sua qualidade única, incluindo
inevitavelmente, essas implicações que são pessoais, antes de
serem morais e sociais, que era ao mesmo tempo muito apoiada em
sua insistência de que o poeta não é uma pessoa em tudo, apenas uma persona e que imputar a ele uma existência pessoal é uma violação do
decoro literário....

"......The doctrine of the impersonality of the artist was loyally
seconded by the criticism that grew up with the classic
modern literature. In its dealings with personality this criticism played an elaborate, ambiguous, and arbitrary game.
While seeking to make us ever more sensitive to the implications of the poet's voice in its unique quality, including
inevitably those implications that are personal before they
are moral and social, it was at the same time very stria in
its insistence that the poet is not a person at all, only a persona,
and that to impute to him a personal existence is a breach of
literary decorum....."